A pesquisa Indicador de
Alfabetismo Funcional, conduzida pelo Instituto Paulo Montenegro em parceria
com a ONG Ação Educativa, aponta que apenas 22% dos brasileiros que
chegaram à universidade têm plena condição de compreender e se expressar. Na
prática, esses jovens adultos estão no chamado nível proficiente –o mais
avançado estágio de alfabetismo. São leitores capazes de entender e se
expressar por meio de letras e números. Mais ainda, compreendem e elaboraram
textos de diferentes modalidades (email, descrição e argumentação) e estão
aptos a opinar sobre um posicionamento ou estilo de autores de textos. Em
contrapartida, a pesquisa de 2016 aponta que 4% dos universitários estão no
grupo de analfabetos funcionais.
Os dados de leitura, escrita e
interpretação do Brasil ajudam a entender algumas das origens desse baixo
índice de letramento como, por exemplo, os resultados de Enem (Exame Nacional
do Ensino Médio) de 2014, que mostra que 537 mil alunos zeraram a redação da
prova –ou seja, quase 10% do total de 6 milhões de participantes que entregaram
a prova. Em 2017, por sua vez, 309 mil alunos zeraram a redação, e apenas 53
tiraram a nota máxima.
Na análise do Pisa (Programa
Internacional de Avaliação de Alunos), a distância do Brasil em relação a
outros países é imensa. Os dados de 2016 colocam luz sobre um dos problemas
cruciais da educação brasileira, visto que indicam que entre os 70 países
avaliados, o Brasil fica na posição 59 em termos de leitura e interpretação.
Com todas as evidências e dados, é
hora de colocar a escrita, a leitura e a interpretação como bandeira em todos
os níveis da sociedade. A capacidade de comunicação e a linguística são
habilidades complexas do ser humano e, para exercitar, precisamos de estímulos,
referências e políticas de Estado que deem prioridade a estes aspectos
educacionais.
A leitura nos leva a aprender, a
sonhar e a ter experiências de lógica, além de vivências criativas que mudam
vidas. A vida é construída com falas, recepção, risos, sarcasmos, fábulas.
Também é construída a partir do entendimento daquilo que é diferente,
entendimento do outro.
Quando converso com professores,
empresários, pais e mães –ou seja, com várias matrizes da sociedade–, todos
falam que um número expressivo de pessoas tem dificuldades de escrita, leitura
e interpretação. Em muitos casos, o mundo fica difícil de ser interpretado.
Espinhoso e polêmico, o problema
da educação no Brasil não será resolvido com uma bala de prata, uma única
iniciativa. Deve-se pensar em soluções integradas como a Olimpíada Brasileira
de Redação, que estimula a mobilização de todos os estudantes do país.
É preciso que os processos de
recrutamento das empresas deem mais valor para atividades que incluam o texto
como avaliação. E também contar com os negócios de impacto social focados em
educação para endereçarem soluções viáveis.
Como educador, tenho acompanhado
com perplexidade que nunca se escreveu tanto, tão errado e se interpretou tão
mal na história da humanidade. Como empreendedor da Redação Online –primeira
edutech acelerada na Estação Hack, iniciativa do Facebook em parceria com a
Artemisia– defendo que o empreendedorismo de impacto social é uma importante
ferramenta para vencer esse desafio de melhorar o letramento dos brasileiros.
Em 2018, tivemos a alegria de ter,
entre os alunos, 120 aprovados em medicina, a maioria deles vindos de escolas
públicas. Em locais como Ilha de Marajó, com acesso de internet difícil, a
solução comprova o impacto social. Com um upload rápido, o aluno pode baixar o
conteúdo em uma área com wi-fi, por exemplo. É diferente da aula online que
requer um serviço de internet melhor.
Defendo que saber ler e
interpretar é questão de sobrevivência. O prazer de ler, escrever e interpretar
amplia nossos horizontes, amplifica a nossa imaginação e nos liberta de
preconceitos, extremismos e opiniões fundamentalistas.
Otávio Pinheiro - Historiador e cientista político, foi escolhido Talento da Educação pela Fundação Lemann em 2017 e é diretor-executivo e fundador da plataforma de correções Redação Online, acelerada na Estação Hack do Facebook e Artemisia, parceira do Prêmio Empreendedor Social
Fonte: Folha
Edição: F.C.