A história da educação no
Brasil é um acúmulo de omissões e até mesmo de ações propositais que resultaram
numa situação de extrema desigualdade social, com um analfabetismo ou um
analfabetismo funcional endêmicos, um vergonhoso estado geral de ignorância e
de desprezo pelo conhecimento.
Para quem analisar nossa
história, fica claro que a proibição do voto aos analfabetos sempre foi
intencional, pois o governante somente tinha de prestar satisfações a uma
minoria privilegiada, da qual esse mesmo governante provinha. Como a maioria
era analfabeta, e não tinha voz nem voto, o governante só poderia ser alijado
do poder pela ínfima minoria para quem governava, e podia desprezar solenemente
as necessidades da imensa maioria dos brasileiros, aumentando assim, ano a ano,
século a século, o abismo social que nos define.
A exclusão brasileira foi
criada propositalmente pela reserva do acesso à educação somente a uma parcela
dos brasileiros, porque só há uma riqueza a distribuir, e essa riqueza é o
acesso a uma educação de qualidade.
Felizmente, depois de três
séculos de domínio e de espoliação colonial, mais quase outros dois séculos de
manutenção do mesmo estado de exclusão, primeiro imperial, depois de
republiquetas e/ou de ditaduras em que a reserva da educação para poucos
continuava a ser usada com fator de "proteção" da elite, o Brasil vem
tentando construir um estado democrático há cerca de trinta anos.
Pela primeira vez em nossa
história, o voto foi estendido a todos os brasileiros, e o direito à
escolarização tornou-se universal, com a oferta de vagas no ensino fundamental
a todas as nossas crianças. Agora, em pleno século 21, consolidar essa
democracia afinal conquistada é um trabalho hercúleo, uma obrigação de todos os
brasileiros. Sabemos que, mais que nunca, o passaporte para um futuro feliz e
realizado é o acesso a uma educação de qualidade.
Agora, finalmente, conseguimos
oferecer vagas na escola pública para cada criança, mas essa cultura do atraso
faz com que os despossuídos encarem a frequência escolar não como um direito
libertador, mas como uma obrigação. Tantos séculos de atraso acabaram por fazer
com que a maioria de nós, os despossuídos da história, sequer tenhamos ganas de
reivindicar nosso direito à educação.
Muitas famílias enviam seus
filhos à escola de má vontade, alguns somente para cumprir as exigências das
bolsas-família, e as próprias crianças festejam quando algum professor falta à
aula e elas podem ficar brincando à vontade no recreio. Séculos de exclusão não
criaram um anseio por este direito por parte dos próprios excluídos!
A maioria dos pais dessas
crianças está disposta a fazer sacrifícios para comprar um tênis de grife para
seu filho, mas protesta quando tem de gastar qualquer quantia para comprar-lhe
um livrinho sequer. Isso significa que a família brasileira acha mais
importante investir no pé do que na cabeça do seu próprio filho...
Como reverter esse quadro? Como
incutir na consciência das famílias que a felicidade e a riqueza só podem ser
conquistadas pelo conhecimento, pelo acesso à ciência, à tecnologia? Como
poderemos obrigar o brasileiro a ser feliz?
Acredito que obrigar é
impossível. Enquanto tentarmos enfiar o conhecimento goela abaixo de nossas
crianças como um purgante, utilizando as punições, as suspensões e as
reprovações como instrumentos de persuasão, só teremos fracassos pela frente.
Nossa escola tem de ser
fascinante, atraente, cheirosa, utilizando como fator de atração a literatura
infantil e juvenil hoje produzida por centenas de ótimos autores, para que os
sonhos e a alegria desses livros possam fazer com que os alunos anseiem por
estar na escola, não comemorem os feriados. Não basta que tenhamos criado vagas
para todo mundo. É preciso que a porta da sala de aula seja o pórtico da
felicidade.
Os brasileiros têm de compreender
que estudar não é chato; chato é ser burro!
Colaboração Uol Noticias