Existem certas coisas que não
precisariam ser faladas, tampouco cobradas, de tão óbvias. Porém, passamos a
vida lembrando algumas pessoas daquilo que elas deveriam já ter como hábito e
isso cansa, diminui, abalando a autoestima de qualquer um. Se tivermos que
lembrar aos outros o óbvio todos os dias, a todo instante, enlouqueceremos.
Amizade não deveria ser cobrada.
Ter que correr atrás o tempo todo da pessoa, enquanto ela nem se lembra de que
a gente existe, exaure a paciência mínima de um ser humano. Quando temos que,
só nós, ficar mandando mensagens, telefonando, convidando procurando, é hora de
repensar aquilo tudo, porque, provavelmente, a amizade somente existe em nós.
Do outro lado, amizade é que não tem.
Carinho não deveria ser pedido,
mas sim espontâneo, verdadeiro, necessário em quem oferta, tanto quanto em quem
recebe. Carinho não somente se trata de toque, porque a gente se sente amado
principalmente pelas atitudes do outro, pela forma como ele nos faz sentir,
mesmo de longe. Ter que ficar cobrando palavras, gestos, comportamentos, ter
que lembrar nossa existência a alguém é por demais humilhante. Ninguém merece.
Amor que se mendiga é tudo, menos
amor. É o contrário de amor, é o que contraria o amor em si. Sentimentos vêm de
dentro e transpiram por todos os poros, materializando-se no encontro que
transforma, no calor que motiva, na certeza que acalma, no abraço que reinicia.
O amor precisa se expandir, precisa ser expresso, dito, ouvido, vivido, sem
melindres, sem rodeios. Se houver carência de um ou de outro lado, não há
reciprocidade e, então, amor nem tem.
Nossa sobrevivência em muito
dependerá do discernimento entre o que é luta digna e o que nada mais é do que
insistência servil. Lutar pelo que queremos não significa implorar por atenção,
por amizade, por carinho, por amor. A dor da consciência sobre quem não está
mais junto sempre será uma oportunidade de recomeço. A dor da solidão
acompanhada, porém, jamais nos tornará dignos de sentimentos verdadeiros e
recíprocos. É isso.
Por
Marcel Camargo
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"Escrever é como
compartilhar olhares, tão vital quanto respirar". É colunista da CONTI
outra desde outubro de 2015.